Por Cláudia Lamego
Marcia Zanelatto tem obras nas áreas de dramaturgia, roteiro, romance, poesia e biografia. Recebeu alguns prêmios como dramaturga, entre eles o Prêmio ATPR de Melhor Autora de 2014, pela peça Desalinho, inspirada no universo da poetisa Florbela Espanca.
Você é uma artista com múltiplas atividades, no teatro, no cinema e na literatura, e que vem gerando muitos “filhos” ao mesmo tempo, como contou outro dia num texto de uma rede social. Qual foi a sua maior motivação para escrever esse livro sobre o Thammy?
Minha motivação foi política, no sentido de contribuir com a erradicação de um dos preconceitos sociais mais violentos no Brasil, que é o preconceito quanto à sexualidade. Os índices de homicídio contra LGBTs são alarmantes. E o preconceito contra os transgêneros está sendo estimulado por fundamentalistas religiosos, alguns deles com muito poder no Congresso. É a famosa bancada evangélica que nas últimas eleições cresceu expressivamente – enquanto as pessoas estavam distraídas com o Fla x Flu, Dilma e Aécio, etc. O cidadão brasileiro ainda não percebe o poder do Congresso, acha que quem manda é o presidente… Isso tudo é muito perigoso para o nosso país. E todos nós temos que arregaçar as mangas porque a barbárie está crescendo e ninguém está protegido.
O livro tem gerado muita repercussão na imprensa, principalmente em sites e revistas que cobrem a vida das celebridades. Para além desse interesse sobre aspectos da vida íntima do Thammy, como você acha que o livro pode contribuir para a reflexão e o debate sobre a transexualidade no país, principalmente em relação a políticas públicas e nas relações sociais, tanto nas casas das famílias, quanto nas escolas e nos ambientes de trabalho?
A isca é essa mesmo. A pessoa vai atrás de um livro sobre fofoca de celebridades e encontra uma lição de coragem e de liberdade de expressão. Entende melhor o que é ser um LGBT e porque essas pessoas merecem tanto respeito quanto qualquer outra. É um livro sobre a beleza de ser o que se é. Sem mentiras, sem hipocrisia. Sobre como o Estado pode lidar bem com as singularidades dos cidadãos. Sobre como é possível amar as pessoas como elas são. E que louco, como disse o poeta, é quem me diz que não é feliz. A história de Thammy pode ajudar muita gente a sair dessa onda errada de raiva e preconceito. E, mais do que tudo, pode ajudar familiares a se compreenderem nas diferenças. Para um ter razão, não necessariamente o outro está errado – é preciso pensar diferente. Se as famílias se fortificarem em seus laços de amor e compreensão, o Estado se fortifica em políticas públicas para atenderem a essas famílias.
Para além do Thammy conhecido pela mídia, filho da cantora Gretchen, primeiro símbolo sexual e agora um artista em busca de reconhecimento de sua nova sexualidade, como você o definiria na intimidade? Quem é o Thammy que você conheceu bem para fazer esse livro?
Thammy é um cara feliz. Feliz e muito bem humorado, o que é sempre sinal de inteligência. Tem os problemas dele, claro. Mas é uma grande pessoa. Corajoso, com vontade de crescer e aprender. Gentil e bom companheiro. Um homem com alma de mulher (risos).
No livro, você cita o juiz que autorizou a realização de cirurgias para a mudança de sexo como um bom exemplo de cidadão e representante do que de melhor a nossa democracia pode ter. Há avanços e retrocessos nas lutas pelos direitos humanos em geral. O livro se insere nesse contexto de luta por avanços também?
O livro só existe para isso. Mais nada. (risos)