Por Carlos Andreazza
Nos últimos cinco anos, tudo no Brasil ficou mais caro. O preço do livro, não. Ao contrário: todos os custos aumentando, os insumos inflacionados, e, no entanto, as editoras ainda baixando os preços.
Nem me aprofundarei na questão conceitual acerca de valor. O editor também é um educador. Insisto nisso. Tem, pois, a obrigação de tornar pública, de disseminar a complexa cadeia produtiva que resulta no livro. Diversamente do que manifestam livros a vinte reais ou mesmo menos (e ainda antes dos eventuais descontos dos livreiros), o nosso produto não é fruto de milagre de repente materializado nas livrarias.
Paga-se sessenta, setenta reais por muita porcaria efêmera neste país, e nós entretanto com medo de cobrar quarenta, cinquenta reais por algo de caráter permanente. Por quê? Não tenho a resposta, mas seu mais mínimo esboço passará obrigatoriamente pela constatação de que ou se compreende mal o ambiente editorial brasileiro ou pouco se preocupa com sua saúde.
Livros desvalorizados não formam consumidores, muito menos – é mentira – popularizam o livro. Em uma palavra: deformam. Outra: viciam. E ainda: vulgarizam. Aí vem a Bienal e então virão as variantes da pergunta: “Tem livro de dez reais?” Não é a procura pelo livro, por aquele livro desejado, mas pelo preço – com o qual não se paga hoje nem picolé.
Que um ou outro título seja agressivamente barato, isso é estratégia comercial legítima. É preciso estudar e compreender a natureza do que se publica e a que público se destina. Mas que a baratização do preço de capa do livro seja política, prática indiscriminada, independentemente do caráter da obra editada, isso significa – ainda que inconscientemente – investir contra o processo editorial que deságua em produtos cada vez melhores e mais bonitos.
Faz pouco, a título de exemplo, publicamos, do historiador Antony Beevor, o já clássico A segunda guerra mundial, obra cuja pretensão é simplesmente a de esgotar o assunto, um volume de 951 páginas, com encarte de fotos, editado e produzido ao longo de pelo menos dois anos, com tradução de excelência, revisões técnicas detalhadas, inúmeros tratamentos de texto, e isso sem falar no adiantamento de direitos autorais, em dólares, pago ao autor – um livro pelo qual cobramos, sem dúvida ou remorso, justíssimos 98 reais.
Retorno, então, ao tema da educação; do papel pedagógico do editor. Mais do que abrigar todo esse encadeamento de valor objetivo, o preço do livro precisa representar – evidenciar – a importância, a complexidade, a grandeza da empreitada ali concretizada. O indivíduo que lê, que consome livros, precisa ser informado – e preço informa – do conjunto valioso de ofícios que se consolida naquele produto. Porque esse mesmo sujeito sairá da livraria para comprar – por cem reais, e sem reclamar, consciente de que paga o quanto leva – um bom vinho francês. Há toda uma tradição a fundamentar isso, a embasar essa percepção. Precisamos criar a nossa.
Precisamos também pensar no livreiro. A cada ano, afinal, sobem-lhe o aluguel, os salários, a conta de luz. Para que seu negócio sobreviva, não há mágica possível: ou o preço do livro é corrigido ou ele terá de aumentar o número de exemplares vendidos. Como a base consumidora de livros não cresce, as livrarias fecham. Quantas outras terão de quebrar até que se considere e encontre um equilíbrio entre preço de venda e custo da operação?
Preço fixo não é a solução. Preço é instrumento do livre mercado. Sou a favor de que livrarias deem desconto. E quero – desejo mesmo – que a cultura competitiva no mercado editorial se desenvolva livre de artificialismo, tendo por origem uma base real: um preço de capa consistente com todo o valor agregado na cadeia de que o livro é produto final. Simples assim.
Há nisso tudo – na resistência a que se aumente o preço de capa do livro – um grande engano sobre o que seja uma editora, francamente compreendida como a exploradora, como aquela que espolia autores, livreiros etc., quando, na verdade, e cada vez mais, é a única (repito: a única) a correr riscos em todo o processo, e isso tendo margens de lucro progressivamente menores, para o que muito contribui esse auto-boicote, essa deturpação que impõe, ainda pior que o congelamento, o rebaixamento de preços. Não é aceitável que armemos a forca contra nossos próprios pescoços.
Fabio Negro
acredito que leitores que perguntam se “tem livros de dez reais” não sejam os mesmos que pagam mais de 10 reais por um picolé ou que paguem cemreais num bom vinho francês
a classe C, essa responsável pela explosão de vendas na ultima decada, não faz comparação entre valores agregados. ela simplesmente confere quanto tem no bolso e qual entretenimento rende mais por aquele valor. Livro era uma boa opção, mas para eles deixou de ser